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domingo, janeiro 27, 2013

Lincoln

O filme, a que fui assistir porque esperava enquanto a chuva de canivetes não passava, meu carro ilhado entre duas piscinas, uma no Baixo Gávea, outra na rua ao lado do shopping, e que só pude assistir porque um casal de senhores desistiu de última hora, ainda consegui um lugar bom, não é lá tudo isso, mas nem eu esperava que fosse.

Lincoln, o incensado presidente, chamado de tirano por uns e que teve a morte de um Julio Cesar, foi um contador de histórias, e ele adorava um livreto que circulou no início do século XIX com causos e histórias fantásticas sobre George Washington, e que criou o mito do homem incapaz de contar uma mentira. Há uma gravura mostrando George Washington discursando e os ouvintes rindo dele porque era incapaz de mentir. Mas essa história que Lincoln conta, embora tenha Washington no meio, não foi protagonizada por ele. Um ianque fora em missão ao Reino Unido finda a guerra de independência e, entre animosidades dispersas, um lorde convidou-o para um baile. Ele lá foi e visitando a latrina, deparou-se com uma gravura de Washington. Na saída, não falou nada a respeito, ao que o anfitrião veio lhe perguntar: "Viste o quadro de Washington?", "Vi sim.", "E que lhe pareceu? Está num lugar apropriado?", ao que ele, depois de um tempo, responde: "Está sim. Washington faz vocês se cagarem todos de medo."


Lincoln aparece afabilíssimo na primeira cena, numa audiência com dois soldados negros. Lincoln deve ter sido realmente um homem de trato muito afável, "with malice towards none", e Daniel Day Lewis viveu bem isso. Ele me dá a impressão de ser um ator sensacional, em quem nada falta, nada sobra, muito técnico, e por isso sinto que falta algo nele, falta o defeito que gera a garra pela melhora. Isso é implicância, claro. Nelson Rodrigues, o chato, intuiria a que me refiro.


Fora a deliciosa história que contei, a melhor cena do filme deve ser o diálogo de Lincoln com sua esposa, interpretada por Sally Field, com quem não simpatizo, ela sempre faz papel de mulher triste e sofrida, sobre a decisão de seu filho de entrar para as forças da União, embora o presidente tenha tentado muito dissuadí-lo. O tema é batido, já foi tratado com louvor no filme O patriota, com Mel Gibson, mas as histórias das vidas se repetem. Desesperada, ela exige que ele proíba o filho de ir para as forças armadas, eles perderam outro filho e não querem perder mais um. Entre idas e vindas, acuado, Lincoln diz que a sua dor é tão lancinante quanto a dela, porém os três, pai, mãe e filho, irão seguir suas vontades; e eles dois precisarão viver com as escolhas de Robert. Ironicamente, foi ele o único dos quatro filhos do casal que morreu adulto.

Como já disseram, o filme é muito escuro realmente. Mas isso não chegou a me desgostar. O ritmo lento, didático quase, não muito diferente do que deveria ser a política de então, imagino, uma e outra história com um leve humor negro que ele conta e uma idolatria de Lincoln, acredito seja isso, incomodaram-me mais.

quarta-feira, setembro 26, 2012

O Leitor

O filme O Leitor conta a história de um rapaz e uma moça vinte anos mais velha que vivem um caso amoroso. Ele tem o entusiasmo e a identificação pelo ser amado que o primeiro amor produz. Ela o ama e gosta que ele leia seus livros prediletos para ela.


Parênteses: aos dezesseis anos, o rapaz lia Homero em grego. No Brasil não existe uma escola, uma mísera escola onde se ensine latim e grego para os jovens. Como o Brasil quer ser país de primeiro mundo se não consegue sequer formar uma elite? Elite, aqui, claro, nada tem a ver com dinheiro, como as classes política e universitária dominantes de hoje, isto é, PT e quejandos, gosta de se referir aos endinheirados (como a zelite).

Se você não viu o filme, advirto para parar por aqui.



Ela se muda sem dar notícia e o romance termina. Ele vai fazer faculdade de direito dali a alguns anos e a encontra de novo em situação inusitada. Ela está no banco dos réus por ter sido guarda de um campo de concentração nazista. No julgamento, as outras guardas a acusam de ter sido a chefe de um massacre, o que é falso, mas ela prefere aceitar a acusação ao invés de fazer um teste de caligrafia. O rapaz, naquele momento, entende que ela era analfabeta. E que tinha vergonha. Quer ir falar-lhe na prisão, mas desiste. Ela decidira não revelar que era analfabeta.

Um dos momentos mais bonitos do filme é ela aprendendo a ler na prisão a partir das fitas cassete que ele lha manda declamando a Odisséia de Homero e outros livros. Esse é o único contato que há entre os dois. Eles não se vêem durante esses anos.

Imagino como deve ter sido difícil ter amado uma mulher que foi uma carrasca nazista. Ao mesmo tempo, ela obedecia a ordens, não ordenou a morte de ninguém. Sua responsabilidade não é simples de ver. Quem sofre com o recolhimento do rapaz, já homem, é sua filha. Ela não entende por que é ensimesmado e acha que pode ser algo consigo. "Como você está enganada, filha". Mas ele quer explicar para ela. O filme termina com ele levando-a para visitar o túmulo de Hanna, onde lhe contará sobre sua história de amor.

Ponto fraco do filme é o encontro de Michael com uma sobrevivente do campo nazista a quem Hanna quis legar o dinheiro que guardou. O diálogo não foi bom, e Ralph Fiennes poderia ter desenvolvido melhor a cena.

quarta-feira, janeiro 04, 2012

Tropas de Elite 1 e 2

A interpretação do personagem Nascimento no segundo é melhor, até porque Wagner Moura já o conhecia há mais tempo, e pode trabalhá-lo bastante depois da repercussão do primeiro filme.

A consciência imediata de questões comportamentais no primeiro, em meio à sucessão torrencial de pressões do trabalho e da vida pessoal, que faz a riqueza do primeiro filme, esvazia-se numa consciência política no segundo. Não me venham dizer que o amor filial no segundo mantém a tonalidade da consciência em meio a esquemas e brigas políticos, porque o amor filial é quase um instinto. Não, a epígrafe do primeiro filme, uma sugestão, tendência, torna-se, no segundo, uma tese. Nascimento é um joguete de forças político-sociais, mesmo que queira combatê-las. Sua vida pessoal, seus questionamentos morais, como a vontade de recuperar o corpo -- reclamado pela mãe -- do fogueteiro torturado pelo Bope, e morto em seguida por traficantes, apaga-se na acachapante consciência política. Nascimento cresce como ser político, mas como homem perde. Nunca é uma boa troca. A vida política é louvável, mas não deveria cobrar a desistência de questões comportamentais que toda hora nos surpreendem.

O impressionante personagem André também não terá mais vida pessoal nem dilemas morais. Ele se torna apenas o capitão dedicado do Bope. Onde estão suas questões pessoais?

A situação social era o teatro do homem no primeiro, no segundo a circunstância se destaca e o homem vira paisagem, a relação se inverte. Conquanto incensado o segundo, o primeiro Tropa de Elite é melhor.

domingo, setembro 25, 2011

Amor & Cia

O filme Amor & Cia, que só hoje vi, na TV Brasil, de cara lembrará um romance brasileiro famoso. Godofredo é atormentado pela idéia de que seu sócio, MACHADO, o tenha traído com sua esposa, Ludovina.

Ele, porém, gosta muito dela e não sossegará até tê-la de volta depois da separação. E mais, deseja saber o que aconteceu. Que cartas duvidosas eram aquelas? Que criança foi parida durante a temporada de Ludovina em Minas?

O Brasil não é feito apenas de cínicos ou de observadores à margem como o diplomata Aires, há também os fortes que agem; obrigado a Eça de Queiroz, autor da história (Alves & Cia) que sem querer é um acerto de contas com Machado de Assis, e, por tê-la filmado, ao diretor Helvécio Ratton.

quarta-feira, junho 01, 2011

Old Boy e o espírito, ou sua falta

Não há bondade no filme Old Boy. Oh Dae-su deixa seu cárcere privado depois de quinze anos e nada faz para ajudar um homem com intenções de se suicidar. Ele terá a chance de matar seu algoz Woo-jin, mas, porque perderia a chance de saber por que foi encarcerado, não o faz. A morte de seu amigo No Joo-hwan teria sido evitada se o fizesse.

Woo-jin é o psicopata que aprisiona Oh Dae-su. Ele matou sua esposa e supervisionou a criação de sua filha Mi-do. A ambos hipnotiza para que venham a se tornar, pai e filha, amantes. Seu plano asqueroso se realiza; é uma vingança por Dae-su haver fofocado que Woo-jin e sua irmã Lee Soo-ah, jovens da mesma escola em que estudara, haviam transado. Soo-ah se suicida, ocasião para que Woo-jin permita-se tornar-se um psicopata.

Tudo transcorrido, Dae-su apenas quer esquecer o que aconteceu e recorre à mesma hipnose que o castigou.

Essas histórias de manipulação em grau extremo me fazem lembrar de Viktor Frankl, o psiquiatra que viveu num campo de concentração nazista, perdeu esposa, pais, irmão e amigos, mas saiu dali para amar os homens. Existe espírito para além dos "desejos repugnantes à moral que nos foram impostos pela natureza" (Freud).

sábado, novembro 06, 2010

Um bastardo de Tarantino

No filme Bastardos inglórios, de Quentin Tarantino, faltou aparecer a bondade. Nada a dizer do personagem de Brad Pitt, um carniceiro vocacionado, que tem ainda humor, o que nunca será ruim. Havia possibilidade de um encontro de bondade entre o soldado alemão travestido de ator e a dona judia do cinema na Paris ocupada, porém ela não se verifica. O único momento de atenção que a rapariga lhe dedica surge de um encantamento estético por vê-lo na tela de cinema, quando o tinha estatelado no chão próximo de si, após ferí-lo de morte. Ele tampouco aceitará essa atenção derradeira, cravejando-lha de balas em seguida. Ambos morrem sem amor entre si.

O cineasta que passeia pelo absurdo como se ele fosse corriqueiro não fez seu melhor filme. Bastardos inglórios não acena com a possibilidade de redenção, como Pulp Fiction, nem justifica sua violência pelo instinto materno, como Kill Bill. É apenas a expiação do bode nazista. Mas chega a ser engraçado nas participações do personagem de Brad Pitt.

terça-feira, maio 26, 2009

Anjos e demônios em revista

Entre uma e outra mentira histórica, La Purga, por exemplo, o assassinato a mando da Igreja romana de quatro cientistas membros da sociedade Illuminati, no século dezessete, sociedade essa que só surgiria no século seguinte, e muita correria, tanto correria física quanto na hora de explicar as conclusões das investigações simbólicas, o filme Anjos e Demônios consegue trazer diversão. Não é nem de longe um Indiana Jones, e o final do filme é arrastado. A reviravolta do personagem que ameaça a Igreja é inverossímil, assim como o seu plano de dominação papal, que inclui a ameaça de uma bomba feita de anti-matéria, a qual irá explodir toda a Roma, mas que no último momento detona sem maiores conseqüências.

Enquanto isso, Robert Langdon, o personagem de Tom Hanks, passeia por boas paisagens da cidade eterna e traz momentos de emoção em sua busca para salvar os quatro preferiti, ou seja, os favoritos para a sucessão do papa recém-falecido, que foram seqüestrados.

Para aprender sobre direito canônico em tempo de sucessão papal, o filme também é uma delícia.

Atualização:
Na seção de comentários, a leitora Stella escreveu: "Eu acrescentaria que a imagem que o filme passa da igreja me lembrou os filmes sobre a máfia."

sexta-feira, abril 10, 2009

Gran Torino

Sobre o filme Gran Torino, escrevi o seguinte na página de comentários do crítico Marcelo Janot, que fez um elogio rasgado à produção. Como ele, também gostei muitíssimo.

"Obrigado pelo elogio ao filme, Janot. É um prazer enorme ver que há críticos que gostam desses filmes pessoalíssimos e verdadeiros. Um blogueiro disse que Walt Kowalski é um cordeiro em pele de lobo. Esse é o filme mais esperançoso de Eastwood a que assisti. Se em Menina de Ouro ele tira a vida de outra pessoa, neste ele dá a vida por essa pessoa. Ele deu ao garoto a possibilidade de ter uma vida honesta e salvou catolicamente sua alma. Um filme, como você disse, impactante! O cowboy descobre que não pode salvar a cidade com suas balas, mas pode dar toda a possibilidade de vida para um garoto que tinha baixas expectativas."

segunda-feira, março 09, 2009

Frost/Nixon

O filme Frost/Nixon mostra a entrevista bombástica que o ex-presidente Richard Nixon deu ao apresentador britânico Robert Frost, em 1977, três anos depois de sua renúncia.

Frost era um apresentador popular, acostumado a entrevistar personalidas do mundo pop. Quando ficou decidido que iria entrevistar o ex-presidente, nem ele nem Richard Nixon acreditaram que o resultado poderia ser tão bom.

Para a entrevista, pagou uma soma de dinheiro extraordinária, e só conseguiu zerar o balanço uma vez concluída a entrevista, quando exibiu o seu conteúdo revelador, e conseguiu patrocinadores maiores.


Nixon e Frost antes da entrevista

Nixon não foi um mau presidente. Ele tirou os EUA do Vietnã porque a guerra do sudeste asiático já havia sido perdida, não para os vietcongues, mas para a imprensa americana, que execrava a participação no conflito. A invasão ao Camboja se deu no contexto da guerra contra o Vietnã do Norte; o território cambojano era utilizado como centro de operações pelos vietcongues. Muitos demonizam os EUA pelo envolvimento armado no sudeste asiático, mas não dar a perspectiva deste envolvimento é agir de má-fé. Assim que terminou a guerra, o Khmer Vermelho dominou o Camboja e matou dois milhões de pessoas, um genocídio reconhecido até pela ONU, que vem julgando dirigentes do regime. Os vietcongues, a seu turno, mataram um milhão de pessoas. O número de mortos durante a guerra nem de longe se assemelha ao número de mortos na paz comunista do pós-guerra.

Além de ter sido o presidente odiado por pacifistas hippies, Nixon também se encontrou com Mao Tse-Tung para reatar relações dos Estados Unidos com a China continental, uma ação de valor discutível arquitetada pelo lendário secretário Henry Kissinger.

Nixon, entretanto, é conhecido principalmente pelo escândalo de Watergate, nome do prédio-sede do partido Democrata, que foi invadido em busca de documentos numa ação de espionagem. Aos poucos, a imprensa conseguiu revelar a coordenação de um esquema de espionagem que começava na Casa Branca com a participação de assessores diretos de Nixon. O presidente não teve outro remédio a não ser renunciar.

A entrevista comandada por Frost aconteceria em quatro partes, cada uma versando sobre temas distintos e com a duração de duas horas.

Nas três primeiras, Nixon dominou a entrevista e falou sobre o que quis. Na quarta parte, justamente a que versaria sobre o escândalo Watergate, pivô da renúncia, Frost conseguiu arrancar de Nixon o pedido de desculpas ao povo americano.

O valor maior do filme está na comparação entre os dois homens, que começaram de baixo e se tornaram grandes personalidades, guardadas as proporções. Nixon põe em evidência a questão quando telefona para um Frost arrasado pelo fracasso das entrevistas anteriores e incita-o a se preparar para a última parte. Nixon buscava um homem merecedor de receber as desculpas. E encontra-o no surpreendente Frost.

O filme baseia-se numa peça teatral em que representaram os mesmos atores. Eles se valeram da experiência no palco para conquistar cenas bastante pujantes. A atuação de Frank Langella como Richard Nixon é esplêndida. Michael Sheen também está ótimo na pele do apresentador Frost.

Um filme para quem gosta de política e de bons atores.

quarta-feira, fevereiro 25, 2009

Dúvida

O filme Dúvida, em que estrelam Meryl Streep, Philip Seymour Hoffman e Amy Adams, gira em torno da suspeita de uma freira experiente sobre a prática pedófila do padre com uma criança que estuda na escola da paróquia.


O padre e a jovem freira discutem sobre caso que é tempestade em copo d'água

O filme termina como começou: A dúvida que era tema do primeiro sermão do padre concretizou-se no choro da freira interpretada por Meryl Streep, que conseguiu a transferência do padre de quem suspeitava. A jovem freira representada por Amy Adams, excelente e bela atriz, é a mais razoável na história. Segue as instruções da freira señior de prestar atenção nos passos do padre, mas depois se percebe envolta numa trama injusta de difamação forjada a partir de um acontecimento trivial.

O padre não molestou a criança. O filme é uma espécie de história de Bentinho e Capitu, com a ressalva de que na história de Machado de Assis a questão flagrante não deve ser resolvida, se Capitu traiu ou não Bentinho talvez nem mesmo Machado de Assis quis saber. No filme, ao contrário, o padre não praticou a pedofilia. O tema de Bentinho e Capitu está presente, porque a freira, no papel de Bentinho, jamais acreditará que o padre não praticou o ato criminoso, não importa o que ele diga. E o padre, no papel de Capitu, não tem fibra moral o bastante para fazer valer por sua personalidade forte e confiável a sua versão fiel aos fatos. O padre é quase um covarde, ele assume uma culpa que não tem para evitar acusações sobre culpas menores que têm. A freira possui uma sanha inquisitorial que só uma postura muito firme de um padre disposto a bater nela com uma mão e rezar por ela com a outra poderia frear. O padre não faz isso. Fica com medo de que faltas do seu passado sejam investigadas e venham à tona e por isso aceita que a freira acerte sua transferência. O padre vai para outra congregação ocupar um nível hierárquico superior. A freira señior chora de dúvidas e apenas a jovem freira sai da história íntegra, mais calejada para disputas de poder e com sua inocência a salvo.

Outra tema lateral do filme é a recompensa que o padre tem por não ter resistido a falsas acusações que lhe eram imputadas. Ele não enfrenta o Leviatã e é promovido. Às vezes, o preço a ser pago por conseguir agüentar o tranco é alto, no caso do padre sua carreira poderia ser seriamente prejudicada.

Creio, acompanhado de Rubens Ewald Filho, que a atuação de Meryl Streep foi um pouco forçada no início. Ao longo do filme, porém, ela conquista o seu personagem e consegue uma ótima atuação. Philip Seymour Hoffman, por sua vez, também está impecável como o padre que não comete o pecado de que é acusado. Amy Adams, por fim, daqui a pouco arrebatará o seu Oscar. Te cuida, Anne Hathaway!

sábado, setembro 13, 2008

Os Desafinados, de Walter Lima Jr.

Esboço Crítico
por Anônima Veneziana

Apesar do elogio da crítica e do início promissor, Os Desafinados, novo filme de Walter Lima Jr., é uma decepção completa, sobretudo se considerarmos que o diretor e roteirista (o roteiro também é assinado por Suzana Macedo e Elena Soarez) desperdiçaram um belo elenco, um tema bom - de enorme apelo, ao tratar a Bossa Nova e o otimismo do fim dos Anos Dourados -, provavelmente um orçamento compatível, não encontrando enredo à altura. O filme é constrangedor e uma oportunidade perdida.

Os Desafinados cai brutalmente de ritmo quando deixa para segundo plano a carreira do simpático e bem humorado grupo musical e o acertado tom irreverente do início e investe em dramas pessoais sem a competência necessária, aventurando-se depois num drama político repleto de clichês - faltou um bom roteiro, repito. Nesse momento, o espectador nota a falha na escolha do elenco, principalmente no casal protagonista, dois grandes atores da nova geração, Rodrigo Santoro e Claudia Abreu, que não combinam e acabam por cair em desempenhos repleto de esquematismos, indignos da carreira de ambos. Certamente, não fizeram testes de câmera com os dois. Não necessariamente dois grandes e belos atores funcionam bem juntos. Foi o caso.

Outro grande equívoco é o clima francês do apartamento de Glória (personagem da Claudia Abreu) em plena Nova York, ainda que se possa justificar pelo fato de ela apresentar uma inclinação française e ter se refugiado em Paris tempos depois. Por que Nova York não pode ser Nova York? Será possível que afora o clube de jazz não poderiam mesclar traços da vida na big apple com personagens tipicamente brasileiros? Os únicos fatores que identificam os personagens como brasileiros são a língua e a música - ah, claro a saudade da rabada e da caipirinha (Ai meu Deus!). Figurino, cabelo, vinho, banho, cigarro, tudo em clima bem parisiense - o diretor nem parece brasileiro tantas são as referências francesas.

Os conflitos praticamente inexistem e quando aparecem são tratados preguiçosamente sem que o espectador esteja preparado para o que vem a seguir; eles caem de pára-quedas sobre sua cabeça. Simplesmente assim. Um exemplo disso é quando Glória descobre a existência de Luiza (Alessandra Negrini, que não merecia um personagem tão apagado), esposa plácida de Joaquim que está grávida esperando-o no Rio de Janeiro - uma fofa (com ironia, por favor)! O espectador desavisado já tinha se esquecido dela e provavelmente o próprio marido também. Uma cena curta de Joaquim conversando com um dos músicos da banda resolveria a questão da liaison.

Uma tendência irritante do cinema de hoje é enfeiar atores lindos, como Rodrigo e Alessandra. Só Claudia Abreu se salva. Santoro passa mais da metade do filme curvado. A lista de equívocos é imensa - ah, claro, tem de ter cenas de nudez e sexo e quase sempre gratuitas como a cena da banheira, mas isso a gente já sabe - mas vou apenas citar outro lamentável engano quando, lá pela metade do filme, tentam transformá-lo em drama político, aproveitando a história de Tenório Jr, músico desaparecido em Buenos Aires quando acompanhava Vinicius e Toquinho em temporada na cidade, para dar um fim ao pianista Joaquim (uma saída fácil para o fraco triângulo amoroso Joquim-Luiza-Gloria, quando o espectador inteligente se perguntava como seria resolvido o imbróglio). Os roteiristas fizeram um 3 em 1, uma colagem mal feita de vários filmes possíveis. Se a proposta ainda fosse uma versão para o cinema do experimento pós-moderno de Italo Calvino, em Se um viajante numa noite de inverno, a gente até engoliria. Mas nem isso. Uma pena.

...............

Comento:

Para complementar as críticas, a cena dos agentes americano de imigração é ridícula. Parecem os cassetas Fucker and Sucker. HAHAHA. Por fim, o filme que começou na linda praia do Rio de Janeiro terminou numa boate de strip-tese em Copacabana, em tom decadente e saudosista. O diretor se entrega.

Nada mais havendo a dizer sobre os estruturalismos, desconstrucionismos e pós-ismos (ou seriam possismos?), deixamos por encerrado esse esboço crítico dizendo que atores como Selton Mello (Dico) assim como o ator Artur Kohl, que representou o personagem Dico no presente, merecem filmes melhores para atuar (Boa Selton, a sua fala 'Entra lá, cara, tu é o pai.' é sensacional).

quinta-feira, setembro 04, 2008

Estrada para perdição


Michael Sullivan na cena em que mata John.

--Por que você ri?
--Porque essa merda toda é histérica.

Essa é a resposta de Connor Rooney, interpretado por Daniel Craig, a Peter, filho pequeno de Michael Sullivan, que Tom Hanks interpreta.

Depois de tentativa de intimidação que acabou em morte, percebendo que um filho de Michael Sullivan assistira ao evento, Connor Rooney decide matá-lo. Isso dá início a uma jornada que une pai e filho, Michael Sullivan e o garoto Michael Sullivan Jr. (Tyler Hoechlin), sobreviventes do massacre.

Michael Sullivan está decidido a vingar a morte do filho pequeno e da esposa. O pai de Connor, John Rooney, mafioso interpretado por Paul Newman, não está disposto a permitir. Embora tenha um carinho enorme por Michael e sinta muitíssimo a morte de sua família, John Rooney não pode permitir o sacrifício de seu filho. John ajudara Michael e empregava-o como capanga.


Michael e John antes do massacre

Um tema que não se esgota nos filmes de máfia é o sentimento verdadeiro do criminoso para com sua família. Ele quer o melhor para ela, embora não seja digno de pedir isso e receie pelo que ela venha se tornar. Nos filmes de máfia, o código de honra é sempre uma constante. É por isso que, como contraste, o bandido Coringa, rival do Batman, é um tipo extravagante. Ele não está em busca de dinheiro nem se submete a uma regra moral. Quer apenas ver o circo pegar fogo.

Uma das cenas mais marcantes do filme é quando John e Michael se encontram no sótão da Igreja. John diz a Michael:

--Você está me pedindo para sacrificar meu próprio filho e isso é algo que eu não posso fazer.
...
--Ninguém aqui vai para o céu, Michael. Só há assassinos nessa sala.
--Michael poderia.
--Então faça tudo que você pode para que ele consiga.

Noutra cena, quando Michael vai matá-lo, John diz:

--Estou feliz que seja você.


Acima, Michael Sullivan e Michael Sullivan Jr. almoçando.

Mais do que um filme de máfia, porém, Estrada para perdição é um filme sobre a relação entre pai e filho. Michael Sullivan e Michael Sullivan Jr. precisam viver uma relação próxima como jamais viveram dentro de casa. Em dado momento, o garoto pergunta ao pai:

--Você gostava mais de Peter do que de mim?
--Não, não. Peter era mais doce... E você era mais parecido comigo.

Michael alcança a vingança. A árdua tarefa da redenção, no entanto, é interrompida no meio do caminho por um algoz que o mata. Michael consegue porém que seu filho não trilhe o mesmo caminho que ele trilhou.

No fim, Michael Sullivan Jr. diz que, quando lhe perguntam se seu pai era um homem bom ou mau, ele apenas responde: "Ele era meu pai."


Pai e filho se abraçam

sexta-feira, julho 25, 2008

Tartufo
















O filme Tartufo, de 1925, é uma obra-prima do expressionismo alemão, que produziu tantas obras-primas. Trata-se de uma adaptação para o cinema da peça de Molière -- a qual não li nem assisti, desculpe -- com uma história por trás. Carl Mayer escreveu um roteiro em que a trama de Moliére será apresentada para desmascarar uma outra farsa. É um filme dentro do filme. O neto de um senhor percebe que a senhora que cuida dele está tirando proveito de sua debilidade física e quer expô-la a uma cena poética a fim de desmascará-la, o que dá um caráter hamletiano à obra. O neto do senhor é um Hamlet que usa Molière para revelar a farsa. Emil Jannings interpreta Tartufo de modo brilhante e a direção cabe à figura máxima do cinema F. W. Murnau.

sábado, julho 12, 2008

Apocalypto




















Apocalypto é um filme excelente, muito bem filmado, que mostra o fim da civilização maia, não pela chegada dos espanhóis, como era de se supor, mas pela luta e determinação de um jovem guerreiro de uma das tribos que os maias perseguiam e escravizavam para serem sacrificados aos seus deuses sedentos de sangue.

Não sou lá entendido de técnicas de cinema, mas a impressão com que fiquei foi de que o filme consegue tirar o máximo de cada cena, filmando a nu os passos de Jaguar Paw, um jovem que vê sua tribo ser exterminada pelos maias e depois é levado até o centro do império para ser sacrificado. Na batalha de sua tribo contra os maias, Jaguar Paw consegue esconder sua esposa e filho dentro de um buraco, do qual no entanto eles não conseguem mais sair depois. O filme narra portanto a luta de Jaguar para voltar à floresta e salvar sua esposa e filho.

Um filme eletrizante, que, pela quantidade de cenas feitas dentro da floresta, fez-me lembrar do romance A selva, do português Ferreira de Castro, o qual conta as agruras de um português que foi morar no coração da selva amazônica.

A direção é assinada por Mel Gibson, bem como o roteiro, em companhia de Farhad Safina. Não se pode deixar de lembrar também a história da conquista do império Azteca por Hernán Cortez, o qual foi ajudado por tribos vizinhas que eram escravizadas há séculos pelos aztecas. A história da colonização da América não é exatamente como contam para a gente na escola.

Ah, e quando virem o filme, atenção à genial cena da menina profetiza. Os aztecas também tinham uma profecia de que um dia chegaria um deus vindo do leste para derrotar seu império.

Apocalypto é um filmaço.