domingo, outubro 27, 2013

Por que ser pobre no Brasil é ruim?

Porque você:

-- demora mais de uma hora para chegar ao trabalho; você perde o tempo que teria para si se o período de deslocamento fosse menor. Tivessem jogado Sim City quando crianças, os gestores públicos brasileiros teriam construído um trem cortando a Av. das Américas, na Barra da Tijuca, em direção ao centro. O metrô, melhor transporte público, atende parte pequeníssima da população.

-- vive com medo de ser assaltado, você não pode caminhar tranqüilo à noite. Cariocas e paulistanos não sabem como isso pode ser bom.

-- seus vizinhos são animais que berram enquanto escutam pagode alto, se bem que isso não é exclusividade de vizinhos de pobres. Brasileiro é um favelado.

terça-feira, outubro 22, 2013

Natureza do dinheiro -- parte 2

Definição: a moeda é o documento do dinheiro, que é o direito de aquisição de um bem indeterminado comercializado.

Lei: aumentar a quantidade de moeda não aumenta a quantidade de dinheiro.

A pessoa que, além de assinar um contrato de trabalho, ainda tem o carimbo na sua carteira, tem dois documentos do direito de receber pelo serviço que presta a seu empregador. Ela tem dois documentos de um mesmo direito, isto é, tem dois comprovantes de um mesmo contrato, não de dois. Tampouco irá trabalhar duas vezes, recebendo o dobro do estabelecido em um contrato.

Aumentar a quantidade de moeda não aumenta a quantidade de dinheiro, embora possa parecer aumentá-lo. A quantidade de bem compráveis continuará a mesma diminua ou aumente a quantidade de moeda. Não faz sentido uma nação aumentar a quantidade de moeda para ficar mais rica. A moeda é apenas a medida relativa pela qual se troca um bem atual pela faculdade de compra de um futuro. Uma nação que tenha muitíssimo ouro no seu tesouro mas cuja produção global seja mais baixa em relação a outra com menos ouro enganar-se-á caso se considere mais rica. Considerando que ambas as nações se ignoram comercialmente, uma pouca quantidade de ouro na segunda compra muito mais bens que na primeira nação.

Não faz sentido, portanto, uma nação aumentar sua quantidade de moeda para ficar mais rica. Mas para o emissor da moeda faz. Porque ele comprará bens pelo seu preço atual, antes que as pessoas percebam a maior quantidade de moeda em circulação e reajustem seu preço. Ele comprará mais para que os últimos a receberem a moeda que emitiu comprem menos. Se é o governo quem emite moeda, aumentar sua quantidade em circulação é nada mais nada menos do que cobrar um tributo, que as pessoas costumam chamar de imposto inflacionário.

Geralmente, a moeda tem um valor de uso desprezível. Isso vale para o ouro, como demonstra a fábula trágica de Midas, o papel-moeda ou o número escriturado em sua conta bancária. Mas por que, dentre essas três, o ouro é o material da moeda mais confiável? Porque é o que opõe mais resistência ao aumento de sua circulação. A quantidade de ouro em circulação no mundo não pode aumentar de uma hora para a outra. No mínimo, seria preciso extraí-lo de uma mina por explorar. Imprimir papel-moeda é mais fácil, escrever um número na conta bancária mais fácil ainda. O ouro obriga o emissor de moeda a engolir em seco seu desejo de aumentar a quantidade em circulação.

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Dinheiro é a riqueza de que se abre mão para se obter um meio de troca, fungível porque portável e durável. É o crédito impagável que o comerciante assume para poder trocar mais facilmente seus bens. É o acordo entre as castas militar-política e empresarial.

Uma diferença do crédito para o dinheiro é que aquele só pode ser cobrado de quem o emitiu, esse pode ser oposto a qualquer comerciante.



Atualização de 01/08/2014: Dinheiro é o desejo, a desejabilidade que um bem inspira na medida em que é usado como troca por outro bem.

É da essência do dinheiro se manifestar num bem, sem se confundir com ele.

Quando é usado como moeda de troca, um bem se dinheiriza, isto é, assume essa qualidade.

segunda-feira, outubro 21, 2013

Adamson pensando em Ratta

Era uma vergonha ter pais assim. Sou seu primogênito, por que fizeram isso? Claro, eu sei que a tarefa era difícil, se sentiam solitários, mas não pensaram em nós? Minha família foi para Edêntia, meus filhos brincariam nas escolas edênicas, ririam, jogariam, e agora? Agora vivo num lugar de que não gosto, não quero morrer aqui. Não sei se vou ter outros filhos, minhas irmãs me amam, eu as amo, mas não como um homem ama uma mulher, há algo mais que preciso fazer. O que será?

Lembro Van me contando histórias, como eu gostava delas. Onde será que ficam as terras de onde veio? Por que não vieram todos com ele para o jardim?

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Seis meses depois

Meu pai tem estado mais feliz ultimamente, minha mãe também, aceitaram seu destino. Já têm ajustadores do pensamento, resignaram-se, perdoaram-se. O meu destino? Às vezes me pergunto o que estou fazendo, eu não sei bem, mas sei. Não é leviandade, é incerteza. Incerteza.

sexta-feira, outubro 18, 2013

Natureza do dinheiro

Na obra Anotações, disse, como questão preliminar necessária ao esclarecimento do que fosse um contrato, que o dinheiro é um direito de aquisição de um bem a ser determinado.

Mas a todo direito corresponde um dever. De quem é o dever de pagar por esse bem? Naturalmente, de quem criou o dinheiro. Como o dinheiro é usado para comprar bens, quem primeiro o emitiu e o usou para adquirir um bem, deve, em última instância, ser responsável por dar algo em troca desse bem.

O dinheiro, portanto, é uma dívida; uma dívida de quem o emite e o usa. O governo dispunha-se a pagar sua dívida em ouro, mas hoje não o faz mais. O governo não pode falir, embora ele tenha dívidas, não pode falir como uma empresa.

Quem emite o dinheiro tem, por definição, o poder de fazê-lo ser aceito. Esse poder, portanto, implica a obrigação de outro de aceitá-lo. Mas essa obrigação pode se tornar meramente nominal se não for sustentada pela confiança de que o dinheiro será repassado com benefício. Desmoralizar o dinheiro significa não querer aceitá-lo.*

Então, o dinheiro surge de uma estranha situação em que seu emissor obriga o receptor a um crédito que jamais lhe pagará. Mas o receptor, por sua vez, passa a ter o direito de comprar de outrem; e assim vai.

Atualização de 31/07/2014: A não ser que Abraão dê um real para cada gado de tributo que cobrou em determinado exercício, dizendo que no exercício seguinte só aceitará como pagamento de tributo reais. E assim faz, cobrando um décimo de cada real que deu.

(continua)

Será mesmo, no entanto, que esse direito, o dinheiro, ao contrário de todos os direitos, não tem a contrapartida de um dever? Não exatamente. O dever do governo é pago não a quem detém singularmente o dinheiro, mas ao grupo de pessoas que governa, coordenando suas atividades. Bem ou mal, e sem direito a apelação, o governo paga sua dívida assim, isto é, governando aqueles a quem governa.


*Caso o dinheiro fosse emitido por uma organização não monopolista, isto é, que não o Estado, a obrigação de aceitá-lo não existiria. Nessa situação o dinheiro seria aceito tão apenas por ter convencido seu receptor de ser o que é, ou seja, um meio de troca largamente aceito, e não apenas o material, ouro, papel, etc, onde se o inscreveu.

Nesse caso, o dinheiro só se confirma como direito quando é aceito, antes disso ele é uma expectativa de direito.

domingo, outubro 06, 2013

René Guénon: o ser e o não-ser

Falando sobre o ser e o não-ser, René Guénon faz uma confusão dos diabos, você não sabe se o não-ser, como o próprio nome aponta, não seria de maneira alguma, nada seria, portanto, ou se é um não-ser que está além da manifestação, que é, mas não se manifesta.
 
Se o segundo caso, por que ele usa a palavra não-ser ao invés de ser, para designar uma realidade, transcendente por excelência, que escolásticos já disseram se tratar do ser necessário, aquele que subsiste para além de toda e qualquer manifestação ou possibilidade de manifestação?

Porque o não-ser incluiria, além do ser necessário, possibilidades de não-manifestação, diz Guénon.

Ele se atrapalha aqui. Que raios vem a ser isso?
 
......

"A onipotência da Deidade não comporta o poder de fazer o não factível."
 
As possibilidades que não podem se manifestar não são possibilidades, são impossibilidades: hipóteses mentais irrealizáveis, cuja realidade deriva apenas do fato de poderem ser pensadas, jamais daquilo a que se referem.
 
"Mesmo o Deus infinito não pode criar quadrados circulares." René Guénon sabe que isso é imanifestável e o chama de possibilidade de não-manifestação. O que ele faz é dizer que é possível que algo seja impossível. Ora, tenha santa paciência!
 
Toda possibilidade é possibilidade de não-manifestação, tal como o copo meio cheio está meio vazio, a possibilidade pode ser como pode não ser. O unicórnio não é impossível, ele apenas não existe. Mas o círculo quadrado é impossível. René Guénon sabe disso, e chama-o de possível.