segunda-feira, fevereiro 11, 2008

Vida em condomínio e a justiça

Ontem o Fantástico apresentou uma reportagem sobre a legalidade da utilização da piscina do condomínio pelas babás. Só assisti ao final da reportagem, onde um casal de senhores considerava inconstitucional a proibição do uso da piscina pelas babás mesmo que a justiça dissesse que esse assunto deva ser tratado na reunião dos condôminos e decidido por cada condomínio. Ou seja, a justiça decide que os próprios moradores resolvam a questão. Não vou aqui dizer que o casal de senhores não tem o direito de afirmar que a decisão da justiça é inconstitucional, afinal a liberdade de expressão é um direito constitucional e portanto um direito 'forte' como aprendi na Argentina, mas também tenho o direito de simplesmenete ignorar o que o casal disse. Ah, justiça brasileira, até quando acertas és criticada? As próprias pessoas envolvidas na questão do seu dia-a-dia devem tentar resolver seus problemas. Bertrand de Jouvenal ressaltava a importância dos poderes intermediários da sociedade como contraponto ao poder avassalador do estado. Os clubes, condomínios, escolas, igrejas, associações de moradores formam uma rede de colaboração que ameniza e inibe a atuação estatal.

Uma coisa é óbvia: o juiz não mora no condomínio para saber as nuanças de uma situação que afeta os moradores. Pode-se objetar que o juiz também mora em um condomínio e portanto conhece a dinâmica dessa relação. Mas ele mora com outras pessoas, em outro lugar, e terá a chance de com elas decidir o que é melhor para o seu condomínio.

Alguém ainda poderia dizer que a justiça se omitiu por fraqueza ou por não saber o que fazer. Prudência não é fraqueza, a super intensidade emocional o é. Se a justiça apenas não sabia o que fazer, agiu bem de não se meter na questão. Mas talvez soubesse bem o que estava fazendo: reconhecendo sua menor capacidade de resolver um problema do que as pessoas que estão envolvidas diretamente com a questão.

Uma das conseqüencias da badalada 'constitucionalização do direito civil' é que agora qualquer questiúncula pode ser tachada de inconstitucional. Os senhores a quem a decisão legal desagradou não eram bacharéis em direito e mesmo assim asseveraram que a decisão era inconstitucional. Isso mostra que de uns anos para cá criou-se uma certa cultura de respeito à Constituição, como aliás o professor de direito constitucional Luiz Roberto Barroso gosta de ressaltar. Mas será que a Constituição merece esse respeito todo? A Constituição é um sistema que deriva proposições de axiomas. Os axiomas, segundo o dicionário Aurélio, são premissas imediatamente evidentes que se admitem como universalmente verdadeiras sem exigência de demonstração. 'A dignidade da pessoa humana' é um axioma. Mas pergunto eu: como resolver a questão das babás tendo em vista a dignidade da pessoa humana? Difícil não é mesmo? Certas questiúnculas fogem do guarda-chuva sistemático e devem ser resolvidas segundo a conveniência política do dia. O risco é que os axiomas e as proposições de direito se tornem “tubos vazios onde cada um coloca o que quer”, que é a definição mesma de fascismo para Pirandello.

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