Acabo de ler o artigo As complexidades da ciência e as limitações do tribunal, publicado no sítio Observatório da imprensa. Comentemos pois o artigo, digno de ser publicado num sítio apoiado pela Fundação Ford.
O autor Ulisses Capozzoli começa o artigo fazendo referências à vinda da família real portuguesa ao Brasil duzentos anos atrás, assunto cujo interesse para o tema não pude discernir, a não ser quando o autor usa o fato para falar das evolução de uma sociedade atrasada, que probia a circulação de jornais, revistas, para uma sociedade que agora pode permitir a pesquisa com células-tronco embrionárias, pegando o bonde da história.
Joseph Mengele, o médico nazista de Auschwitz que ganhou o apelido de anjo da morte, devia achar a mesma coisa quando injetou tinta azul em olhos de crianças, uniu as veias de gêmeos, deixou pessoas em tanques de água gelada para testar suas resistências, amputou membros de prisioneiros e coletou milhares de orgãos em seu laboratorio. Afinal, a roda da história não pára.
“Os 11 ministros que compõem o STF – apesar da pompa e circunstância com que se fazem notar – estarão desempenhando um papel além de suas capacidades intelectuais.”
Como é que pode um ministro do STF, enquanto tal, desempenhar um papel além de sua capacidade intelectual? Será que o ministro vai começar a correr pela sala para prolatar a sentença, exercendo assim a sua capacidade física?
“A imprensa também estará em julgamento quanto a sua capacidade de sensibilizar ou não a sociedade para uma perspectiva da ciência(...)”
Aqui o autor convoca o jornalismo a deixar de lado sua profissão de informar o cidadão sobre os fatos e perspectivas das duas teses em julgamento para abraçar e fazer propaganda de uma das teses.
Chegamos ao ponto: “o embate em torno da Lei de Biossegurança é na essência, por desconfortável e anacrônico que possa parecer, um enfrentamento entre ciência e religião.”
O autor até desconversa-“Não que ciência e religião sejam necessariamente antagônicos”, para afetar aquela douta neutralidade caríssima aos liberais, mas depois afirma ser regra o “obscurantismo que unifica as religiões.”
Bom, ciência e fé não são antagônicos, há pelo menos setecentos anos se sabe isso, desde os trabalhos de Santo Tomás de Aquino. Eles são complementares e harmônicos.
Depois de alguns parágrafos malhando a Igreja Católica, o autor admite o seguinte: “E se desconhecemos a natureza da vida não temos como fixar exatamente quando ela começa.”
É exatamente esse o argumento do ensaísta conservador Olavo de Carvalho para dizer que o aborto não pode ser permitido. Não sabemos quando começa a vida, então se vamos fazer experiência com um embrião, existe a possibilidade de estarmos tirando uma vida humana. Ulisses Capozzoli está disposto a correr esse risco.
“Certamente não é nenhuma façanha intelectual sustentar que o papel das células-tronco embrionárias na reconstituição de órgãos é parte da medicina do futuro. Mas, em muitos casos, pode amenizar de imediato a dura sorte de milhões de pessoas.”
O senhor Ulisses Capozzoli está mentindo quando afirma que o papel das células-tronco embrionárias pode amenizar de imediato a sorte de milhões de pessoas. Até agora nenhuma pesquisa com células-tronco embrionárias chegou a resultados promissores, os resultados promissores vêm da pesquisa com células-tronco adultas, pesquisa a qual não é condenada pela Igreja Católica.
Por fim, comento sobre a separação feita pelo autor entre memória e inteligência. A intenção de Ulisses Capozzoli é dizer que a memória representa a tradição atrasada enquanto a inteligência desliga-se do peso da tradição adotando o bem da ciência. Não é lindo isso? Gostaria de perguntar ao senhor Ulisses Capozzoli se ele precisou se lembrar do julgamento que aconteceu na quarta-feira para escrever o artigo. Talvez o artigo tenha brotado da inteligência futurista de Ulisses Capozzoli sem precisar da memória para lembrar do julgamento. A memória é uma das funções da inteligência, um requisito dela. Quando René Descartes descobriu que existia porque pensava, ele precisou lembrar que pensava antes. Ou fingiu que não lembrou, embolando o curso da filosofia subseqüente. O senhor Ulisses Capozzoli quer embolar toda a discussão sobre o tema da pesquisa com células-tronco embrionárias. Memória certamente ele tem, inteligência não sei dizer.
PS: Enviei o presente artigo para o sítio Observatório da imprensa, não obtendo resposta até o momento.
sexta-feira, março 07, 2008
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