sábado, abril 27, 2013

Incrementum absurdi: Furar esquemas mentais do adversário lançando teses absurdas que o paralisam. Estratagema 40 da dialética erística.

Lançar teses propositalmente absurdas que o adversário terá dificuldade em classificar mentalmente, e que por um momento o paralisam, a não ser lançando mão precisamente do adjetivo absurdas, que parecerá apelativo, quando não desesperado, para os ouvintes.

Dou um exemplo: em 1945, o escritor americano Albert Kahn escreveu um livro, The plot against peace, Conspiração contra a paz, em que acusava os conservadores americanos de tramarem com a Alemanha nazista uma terceira guerra contra a União Soviética.

O que, nesse caso, o político conservador poderia opor a essa acusação infundada? Nada. Xingar o escritor desopilar-lhe-ia o fígado, mas alguns ouvidos mais suscetíveis poderiam desaprovar a reação. Fingir que nada ouviu era-lhe ainda pior, vez que deixava no ar um silêncio suspeito.

Que fazer pois? Desmascarar a tese como aquilo que ela é: um artifício vil para vencer um debate.

Depois da reductio ad Hitlerum, brilhantemente atualizada pela reductio ad fascistum, o incrementum absurdi é o estratagema número 40 da dialética erística.

PS: Albet E. Kahn era um agente de influência soviético.

quarta-feira, abril 24, 2013

Gotham City

Lendo Witness, de Whittaker Chambers, sinto como se estivesse em uma ficção em Gotham City, sem o Batman.

Um ou outro personagem saído de Dostoiévski comporia a cidade escura, em que nada pode ser dito às claras e todo mundo só pensa em escapar de algo que não sabe bem o que seja.

sexta-feira, abril 19, 2013

O economista

Depois de ter escrito mais um artigo para o jornal O Globo denunciando os empresários amigos do BNDES, generalizando seu argumento numa condenação ao capitalismo de compadrio, o economista liberal chega em casa babando de júbilo: "Tô fazendo barulho", fala à esposa, "eles estão pra morrer", goza com um sorrisinho de orgulho, o qual, sem poder disfarçar, lhe treme nos lábios.

De tarde, no twitter, dispara contra a decadência cultural do país em que uma mocinha recebe nota dez com louvor e sugestão de publicação de sua tese sobre funqueiras midiáticas. "Para onde vai o país?", pergunta, "vai não, já foi, para o buraco!", arremata.

E sai feliz com sua vida.

Autores mortos e perfeição

Não me parece a melhor maneira de estudar um autor, ou o assunto que ele propõe, considerando-o "morto". Salvo se ele for repressivo, intimidativo, então matá-lo é  uma defesa compreensível, sente-se mais livre para trabalhar em cima do que ele disse sem querer adaptar-se a seu pensamento. Mas sua vozinha poderá vir puxar a perna do inconsciente à noite, "olha, eu não penso isso, você está achando errado", bom mesmo é considerá-lo vivo, mesmo que seja para brigar ou manter-lhe distância, melhor se for alguém livre e disposto a ver novas possibilidades, com quem conversar, saber o que vai achar, isso tudo tem que ser imaginado a partir do que registrou, intuir-se o que ele acharia, trocar idéias com ele. Não que seja preciso concordar com ele, crescer com ele é que é bom. Sócrates nunca escreveu nada, mas os homens vêm dialogando consigo há mais de dois milênios. Sócrates é uma inspiração de busca da sabedoria, é um autor vivíssimo por causa disso, não fechou num sistema autoritário, ou você está comigo ou contra mim, seu pensamento, ao contrário, deu o impulso inicial, incentivou outros a que praticassem o que fazia, a busca de sabedoria. Enquanto busca, a sabedoria não pode ser capturada. Nem os valores, aliás, que são ideais. Eles são infinitos, nunca se os realiza por completo, daí porque o Livro de Urântia fala em perfeição de propósitos, ou seja, perfeição da busca e do quê buscar, do ato mesmo de querer os valores. A perfeição não seria portanto um estado. Seria uma busca eterna, não uma busca à toa, de algo que nunca se vai achar, mas algo que se revela sempre mais, o lado claro da lua anunciando que o escuro também está lá. Essa busca tem uma peculiaridade: Quanto mais se descobriu, mais se sabe que há algo por descobrir, os lados claro e escuro avançando concomitantemente.

Bons e maus exemplos

Sobre o caso desse mágico que constrangeu uma criança durante show que fazia, o qual rendeu discussões na lista de e-mails do trabalho, uma pessoa escreveu que, embora normalmente pacífica, provavelmente teria partido para cima do mágico, não obstante o mau exemplo que daria a filha.

Ora, discordo do colega. Mau exemplo é ser desleal com o próprio filho. Reagir, ainda que de maneira desmedida, a uma ataque a seu filho, é uma atitude que lhe dará um excelente exemplo. Ele, o filho, terá tempo depois para pensar e dosar sua própria maneira de reagir. Mas se o pai não intercedesse a seu favor, porém, isso sim lhe seria abominável.

Essas observações vão sem entrar no mérito se a atitude do mágico foi absurda ou criticável (esse para mim é o adjetivo que a qualifica minimamente). 

quarta-feira, março 27, 2013

"A esperança é uma erva daninha"

Assistindo ao filme Django livre, lembrei o conto Pai contra mãe, de Machado de Assis, sobre um caçador de escravos fujões atrás das recompensas que os donos ofereciam para sua captura. Nesse conto, Machado não tem aquele viciozinho que o caracteriza, isto é, criar num personagem uma esperança, nutrí-la, e no final dar-lhe cabo para sorrisinho cômico do leitor. Esse conto tem um quê maior de aventura. Só me lembro de outro em que Machado não cede à tentação final da ironia, O conto de escola, simples, cotidianamente familiar, e com uma ponta de abertura para a experiência da vida.

terça-feira, fevereiro 26, 2013

Quando o marine chama por Osama no filme, "Osama", diz baixinho, alguns pessoas riram e eu não consegui não rir também. Rir é aliviar um desconforto, e naquele momento o nervosismo da operação era alto. Kathryn Bigelow é demais, sem pompons brilhosos, está mais para a catadora de caranguejos que para a patinadora olímpica, segundo a tipologia de Marcio Hack.

Colher de chá para Caio Blinder criticando Hollywood, que abandonou o filme no Oscar 2013.

domingo, fevereiro 10, 2013

Onze e meia da noite, voltando para casa, tenho que passar pelo Corte Cantagalo, quando faz papel de mau, Denzel Washington vem para o Oscar, como ele é desagradável, e vaidoso, vaidosíssimo, não, mais orgulhoso que vaidoso, a hipocrisia é o que permite a vida social, venho pensando, devo subir o Corte, à noite pode ter assalto, mesmo numa noite de carnaval, atrás de mim, iniciando a subida, não vem ninguém, ninguém sobe comigo, então desce um rapaz sem camisa, é Carnaval, deve estar sem camisa, sujo e sem camisa, passa por mim, nem olho pra ele, já na descida, vem um rapaz de bike, ladrões usam bike pra fugir rápido, ele cruza por mim sem dar por meus pensamentos, "desculpa ter pensado mal de você", penso, depois, pra aliviar, um casal, a loirinha falando, chego, subo e escrevo.

domingo, janeiro 27, 2013

Lincoln

O filme, a que fui assistir porque esperava enquanto a chuva de canivetes não passava, meu carro ilhado entre duas piscinas, uma no Baixo Gávea, outra na rua ao lado do shopping, e que só pude assistir porque um casal de senhores desistiu de última hora, ainda consegui um lugar bom, não é lá tudo isso, mas nem eu esperava que fosse.

Lincoln, o incensado presidente, chamado de tirano por uns e que teve a morte de um Julio Cesar, foi um contador de histórias, e ele adorava um livreto que circulou no início do século XIX com causos e histórias fantásticas sobre George Washington, e que criou o mito do homem incapaz de contar uma mentira. Há uma gravura mostrando George Washington discursando e os ouvintes rindo dele porque era incapaz de mentir. Mas essa história que Lincoln conta, embora tenha Washington no meio, não foi protagonizada por ele. Um ianque fora em missão ao Reino Unido finda a guerra de independência e, entre animosidades dispersas, um lorde convidou-o para um baile. Ele lá foi e visitando a latrina, deparou-se com uma gravura de Washington. Na saída, não falou nada a respeito, ao que o anfitrião veio lhe perguntar: "Viste o quadro de Washington?", "Vi sim.", "E que lhe pareceu? Está num lugar apropriado?", ao que ele, depois de um tempo, responde: "Está sim. Washington faz vocês se cagarem todos de medo."


Lincoln aparece afabilíssimo na primeira cena, numa audiência com dois soldados negros. Lincoln deve ter sido realmente um homem de trato muito afável, "with malice towards none", e Daniel Day Lewis viveu bem isso. Ele me dá a impressão de ser um ator sensacional, em quem nada falta, nada sobra, muito técnico, e por isso sinto que falta algo nele, falta o defeito que gera a garra pela melhora. Isso é implicância, claro. Nelson Rodrigues, o chato, intuiria a que me refiro.


Fora a deliciosa história que contei, a melhor cena do filme deve ser o diálogo de Lincoln com sua esposa, interpretada por Sally Field, com quem não simpatizo, ela sempre faz papel de mulher triste e sofrida, sobre a decisão de seu filho de entrar para as forças da União, embora o presidente tenha tentado muito dissuadí-lo. O tema é batido, já foi tratado com louvor no filme O patriota, com Mel Gibson, mas as histórias das vidas se repetem. Desesperada, ela exige que ele proíba o filho de ir para as forças armadas, eles perderam outro filho e não querem perder mais um. Entre idas e vindas, acuado, Lincoln diz que a sua dor é tão lancinante quanto a dela, porém os três, pai, mãe e filho, irão seguir suas vontades; e eles dois precisarão viver com as escolhas de Robert. Ironicamente, foi ele o único dos quatro filhos do casal que morreu adulto.

Como já disseram, o filme é muito escuro realmente. Mas isso não chegou a me desgostar. O ritmo lento, didático quase, não muito diferente do que deveria ser a política de então, imagino, uma e outra história com um leve humor negro que ele conta e uma idolatria de Lincoln, acredito seja isso, incomodaram-me mais.

terça-feira, novembro 13, 2012

Vitamina C

A vitamina C frita no copo,
dissolvendo n'água magicamente.
Dissolve a dor que pelo corpo sente
este hóspede de um vírus misantropo.

segunda-feira, novembro 05, 2012

Latim no colégio

As escolas americanas de elite (a revista Forbes as lista como de elite) Choate Rosemary Hall, The Lawrenceville School, Milton Academy, Phillips Academy, Phillips Exeter Academy, Sidwell Friends School, St. John's School (Houston), St. Paul's School (Concord), Punahou School, The Westminsters Schools, Miss Porter's School, The Roxbury Latin School, todas elas ensinam latim. Não olhei as escolas de elite britânicas e alemãs, mas desconfio que também ensinam latim. Talvez nem precisemos procurar nas escolas de elite. A maioria dessas escolas americanas também ensinam grego. Ahh, atenção: todas elas oferecem também o ensino de chinês.

Brasileiro é bobo.

Mas parece que nem todos. No Piauí, a supreendente escola Instituto Dom Barreto conquistou pela terceira vez o segundo lugar no Enem de 2011. Adivinha: eles ensinam latim. A escola é mantida por um grupo religioso.

A pessoa da minha geração que melhor escreve nesse país chama-se Rafael Falcón e é, por que será?, professor de latim. Posso perceber, estudando a língua, que ela te traz eloqüência e muita lógica. É uma língua muito lógica.

Quem cria escolas no Brasil (a par dos grupos religiosos)? A sociologia da educação deveria se preocupar com isso. De onde sai o dinheiro? O que move seus criadores?

terça-feira, outubro 23, 2012

Anotações

Acabo de publicar a obra Anotações, que é continuação de minha monografia de faculdade. O mote começa ainda pelo direito, como no trabalho anterior, mas amplia-se para tratar da sociedade, da história, revelações, etc. Agradeço que leiam. Novamente, dúvidas, sugestões, correções (que las hay, las hay) são sempre bem-vindas. Escrevam-me no e-mail: daniel.lourenco@oi.com.br.

quarta-feira, setembro 26, 2012

O Leitor

O filme O Leitor conta a história de um rapaz e uma moça vinte anos mais velha que vivem um caso amoroso. Ele tem o entusiasmo e a identificação pelo ser amado que o primeiro amor produz. Ela o ama e gosta que ele leia seus livros prediletos para ela.


Parênteses: aos dezesseis anos, o rapaz lia Homero em grego. No Brasil não existe uma escola, uma mísera escola onde se ensine latim e grego para os jovens. Como o Brasil quer ser país de primeiro mundo se não consegue sequer formar uma elite? Elite, aqui, claro, nada tem a ver com dinheiro, como as classes política e universitária dominantes de hoje, isto é, PT e quejandos, gosta de se referir aos endinheirados (como a zelite).

Se você não viu o filme, advirto para parar por aqui.



Ela se muda sem dar notícia e o romance termina. Ele vai fazer faculdade de direito dali a alguns anos e a encontra de novo em situação inusitada. Ela está no banco dos réus por ter sido guarda de um campo de concentração nazista. No julgamento, as outras guardas a acusam de ter sido a chefe de um massacre, o que é falso, mas ela prefere aceitar a acusação ao invés de fazer um teste de caligrafia. O rapaz, naquele momento, entende que ela era analfabeta. E que tinha vergonha. Quer ir falar-lhe na prisão, mas desiste. Ela decidira não revelar que era analfabeta.

Um dos momentos mais bonitos do filme é ela aprendendo a ler na prisão a partir das fitas cassete que ele lha manda declamando a Odisséia de Homero e outros livros. Esse é o único contato que há entre os dois. Eles não se vêem durante esses anos.

Imagino como deve ter sido difícil ter amado uma mulher que foi uma carrasca nazista. Ao mesmo tempo, ela obedecia a ordens, não ordenou a morte de ninguém. Sua responsabilidade não é simples de ver. Quem sofre com o recolhimento do rapaz, já homem, é sua filha. Ela não entende por que é ensimesmado e acha que pode ser algo consigo. "Como você está enganada, filha". Mas ele quer explicar para ela. O filme termina com ele levando-a para visitar o túmulo de Hanna, onde lhe contará sobre sua história de amor.

Ponto fraco do filme é o encontro de Michael com uma sobrevivente do campo nazista a quem Hanna quis legar o dinheiro que guardou. O diálogo não foi bom, e Ralph Fiennes poderia ter desenvolvido melhor a cena.

sexta-feira, setembro 14, 2012

Completamente à revelia do povo brasileiro, oitenta por cento do qual acha que a atual legislação sobre aborto deve ser mantida, o projeto de lei que criaria o novo código penal quer permití-lo até três meses de gestação.

O projeto de lei proíbe o terrorismo, mas se o autor for um movimento social está isento de punição. Não estou inventando. Está lá:

"Art. 239.........................................
 .......................................
§ 7º. Não constitui crime de terrorismo a conduta individual ou coletiva de pessoas movidas por propósitos sociais ou reivindicatórios, desde que os objetivos e meios sejam compatíveis e adequados à sua finalidade."

Não acabou. O projeto de lei extingue o crime de rufianismo, isto é, cafetinagem, o que, conjugado com o fato de que fazer sexo com maior de doze anos não é mais crime, torna liberado o uso do maior de doze anos (sim, doze anos) para a prostituição.

O senhor, José Sarney, é responsável por esse projeto de lei. Você, Sarney, quis ser responsável por essa estrovega. O senhor se vendeu para a vaidade de terminar a presidência do Senado com um feito marcante, dando ouvidos a grupinhos idiotas de pressão. O senhor me envergonha. Desapareça, DESAPAREÇA da vida pública brasileira.

quarta-feira, agosto 22, 2012

Preparando-me para ler Duns Scot:

pego os comentários à metafísica, coloco uma garrafa de conhaque sobre a mesa e dou um murro nela. Olho para o gato e falo: Vamos lá.

domingo, agosto 19, 2012

Ética em Sócrates, Platão, Aristóteles e o Livro de Urântia -- parte 3



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Não é à toa que o Ajustador do Pensamento é chamado de Monitor Misterioso (sobre a dificuldade de explicar como funciona seu trabalho).

A gravura medieval no início do vídeo é de Aristóteles.

sábado, julho 07, 2012

"Pois este é o caminho por que Deus nos guia".

Assistindo à aula que Olavo de Carvalho está dando hoje por ocasião do lançamento de seu novo livro, devo lamentar (mais uma vez) que não lhe tenha interessado ler o Livro de Urântia, o que evitaria erros, por exemplo o de dizer que o daimon de Sócrates lhe impunha atitudes. O daimon de Sócrates é seu Ajustador de Pensamento, o espírito de Deus presente em cada homem nascido em nosso planeta desde que Jesus legou o Espírito da Verdade.*

O Ajustador do Pensamento jamais impõe qualquer coisa ao ser humano a que está ligado, ele lhe sugere, e sempre se sujeita à sua decisão final. O espírito consegue realizar algo quando a vontade soberana do homem coaduna-se com o que o espírito lhe propõe. Eles experenciam em conjunto então, à sua maneira, algo de significativo no plano cósmico.

Sócrates pode chiar que o espírito pede isso ou aquilo, fazer um charminho (na realidade ele não fez, diante da morte agiu com um verdadeiro estóico avant la lettre, só vale como argumento), mas ele quis realizar o que o espírito lhe traz à alma; eles chegaram a um entendimento.

OK, digamos que Olavo foi impreciso no termo que usou (antes que fique ofendido). Numa palestra em que reclama justamente da falta de clareza conceitual, é bom fazermos aqui a nossa parte também.

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* Antes de Jesus (caso algum sujeitinho queira meter-se à besta) o Ajustador do Pensamento também habitava a mente de homens de carne e osso, como a de Sócrates, mas não a de todos.