sábado, maio 14, 2011

Frithjof Schuon e o Livro de Urântia

"O fiel tem percepção intuitiva e inteligência." (Guru Granth Sahib)

A filosofia é uma técnica para resolução, até os seus princípios, de questões que a vida nos coloca, de modo a descobrir os significados em nossa experiência dos valores. Ela procura unificar nossa experiência de modo a chegarmos a uma visão da realidade completa. Para isso, devemos nos tornar capazes de refazer pessoalmente os caminhos das questões que a própria vida nos coloca, indagando-lhes as origens em nossa experiência, procurando estudar o que outros disseram a seu respeito, e relacionando-as com a visão de realidade completa que temos, seja para confirmar o lugar que já lhes era imaginado, seja ajustando o quadro geral para que se responsabilize por elas também.

Metafísica é o conhecimento daquilo que a natureza física, não se bastando a si mesma para explicar-se, indica que haja. É o conhecimento dos princípios que coordenam as experiências humanas material e espiritual, interna e externa. Como a alma, que não ocupa espaço, pode estar no corpo? Essa é uma questão que a metafísica, sucedânea da mota, tentou responder. A alma não está no corpo propriamente. Descartes errou ao dizer que ela está na glândula pineal. Ela se relaciona à mente material e ao espírito.

"A mota é uma sensibilidade à realidade supramaterial que está começando a compensar o crescimento que não se completou, tendo por substância o conhecimento-razão e por essência o discernimento clarividente da fé. A mota é uma reconciliação suprafilosófica das percepções divergentes da realidade que não é alcançável pelas personalidades materiais; ela é baseada, em parte, na experiência de haver sobrevivido à vida material na carne." (LIVRO DE URÂNTIA, doc. 103, 6, p. 1136)

"A metafísica", diz o Livro de Urântia, "mas muito mais seguramente a revelação, proporciona um terreno comum de confluência para as descobertas tanto da ciência quanto da religião, e torna possível a tentativa humana de correlacionar logicamente esses domínios separados, porém, interdependentes, do pensamento, em uma filosofia bem equilibrada de estabilidade científica e de certeza religiosa." (LIVRO DE URÂNTIA, doc. 103, 7, p. 1139)

A revelação não é parcial, mas se subordina à capacidade que o fiel tem de recebê-la. Achar que a metafísica é uma via de acesso a Deus melhor do que a revelação é um erro. Se as religiões que surgem da revelação misturam-se, depois, com crendices e doutrinas duvidosas, cumpre à filosofia ajudá-las a evoluir, afastando do trigo o joio, aos poucos, se preciso, para não causar escândalo -- como fez Moisés, ao falar, embora muito incomodado, de um Deus iroso, ao invés do Deus que ele sabia ser amigo, porque os hebreus não o aceitariam -- e coordenando-a com as descobertas científicas.

"A metafísica tem-se revelado como sendo um fracasso; a mota, o homem não a pode perceber. A revelação é a única técnica que pode, em um mundo material, compensar pela ausência da verdadeira sensibilidade da mota. A revelação esclarece, com toda a autoridade, a desordem da metafísica desenvolvida pela razão em uma esfera evolucionária." (LIVRO DE URÂNTIA, doc. 103, 6, p. 1136)

O que Schuon, inspirado em Mestre Eckhart, chama de Inteligência, nas palavras desse "algo que na alma é incriado e incriável" (SCHUON, De l'Unité Transcendante des Religions, préface) é o Ajustador do Pensamento, o fragmento do Pai que em cada um de nós trabalha assoprando-nos a vontade do Pai Universal.

Schuon parece acreditar que essa Inteligência seja um princípio divino a ser compartilhado pelas criaturas que consigam e queiram acessá-lo. Os eus intelectuais têm sua origem na mente cósmica, a qual é a fonte dos potencias intelecto-espirituais que se especializam nas mentes humanas. Ela explica a afinidade entre várias mentes humanas. Nossa mente é um intelecto emprestado, a ser usado em nossa vida material. Nela se escolhe cumprir ou não a vontade do Pai.

Mas o Ajustador do Pensamento não é comum a vários homens. Cada homem é dotado com o seu no decorrer dos seus cinco anos de vida, uma vez que haja tomado sua primeira decisão moral.

Parece então que as mentes humanas compartilham da mente cósmica, ao passo que o Ajustador é uma graça personalíssima do Pai, embora, claro, aja sempre com o mesmo propósito, qual seja o de elevar a mente humana à adoração e agradecimento ao Pai, dispondo-se a fazer sua vontade.

Pelo trabalho de ambos, se apenas aspirar a ser como o Pai, o ser humano pode tomar posse da promessa de sobrevivência eterna.

Schuon está certo ao dizer que nesta vida muitos fiéis não conseguirão se comunicar, por pensamentos, com seu Ajustador, em processo que o Livro de Urântia chama de auto-revelação, e que acontece pari passu com as revelações epocais, como as de Jesus de Nazaré ou de Melquisedeque, ou as que têm a participação de outros agentes celestes para dar voz ao profeta. Mas podem os fiéis, não obstante, sobreviver, porque mais importante que estar consciente do Pai é querê-lo estar. "Sede perfeitos como o Pai é perfeito".

O homem não precisa ser especificamente diferente do fiel para ter uma visão mais clara do divino. Cumpre-lhe, ao revés, extremar sua relação com o Pai do céu, seguindo suas aptidões e dons natos.

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